quarta-feira, 19 de março de 2008

Pesadelo sem fim à vista...

Pois aí está, o resultado... Satisfeito, Mr Bush?

Pesadelo sem fim à vista
Poucos dias antes de a invasão do Iraque completar cinco anos, nesta semana, ruiu a segunda mais estrepitosa alegação do governo Bush para justificar a guerra contra um Saddam Hussein debilitado por uma década de sanções internacionais. Depois de rever mais de 600 mil documentos, um instituto de pesquisas de Washington, trabalhando para o Pentágono, concluiu que não há indícios de conexões entre a ditadura iraquiana e a organização terrorista islâmica Al-Qaeda. A alegação principal de Bush - a dos arsenais de destruição em massa à disposição do ditador - já tinha sido desmentida pelos próprios militares americanos, em outubro de 2004. Não espanta que, agora, o descarte da ficção fabricada pelo bushismo de um eixo Saddam-Bin Laden tenha tido escassa repercussão. De há muito ficou claro que as versões de Washington, primeiro sobre o imperativo da "mudança de regime" em Bagdá, depois sobre os progressos na construção de um novo Iraque, pacificado e democrático, são uma fraude continuada.

A realidade é que um dos mais longos conflitos armados da história americana, nascido de uma decisão arrogante, temerária, desinformada, sob pretextos falsos e ao arrepio da lei internacional, produziu uma catástrofe humanitária assombrosa, que ofende, antes de tudo, os valores sobre os quais se alicerçaram os Estados Unidos. Nestes cinco anos perderam a vida perto de 4 mil soldados americanos e cerca de 90 mil civis iraquianos. Os feridos e mutilados militares somam 30 mil; os civis, "muitas dezenas de milhares". Dos 25 milhões de iraquianos, 4,5 milhões são hoje refugiados, no país ou no exterior. Só em Bagdá, aproximadamente 1 milhão de pessoas deixaram as suas casas em busca de abrigo, segurança, água, eletricidade, escola e emprego. O terrorismo e a guerra civil entre sunitas e xiitas - a rigor, "uma coleção de guerras locais", aponta um especialista americano -, além da destruição material e da desestruturação de comunidades inteiras, mais a corrupção deslavada compõem um pesadelo sem fim à vista.

A crer nos dados oficiais, o custo da guerra chegará a US$ 650 bilhões este ano, dez vezes mais do que a Casa Branca previa às vésperas da invasão, e chegará a US$ 2 trilhões se a guerra durar mais 5 anos. O economista Joseph Stigliz, agraciado com o Prêmio Nobel, chega a um "custo verdadeiro" de estonteantes US$ 3 trilhões. A cada mês, a ocupação agrega US$ 10 bilhões à dívida americana de mais de US$ 9 trilhões. A crise financeira dos EUA tem relação direta com o Iraque. Washington alardeava que as receitas petrolíferas iraquianas cobririam parte dos gastos. O petróleo, desviado em escala industrial para o mercado negro, financia, isso sim, os atentados que matam mais de 100 civis por semana. "O dinheiro, muito mais do que a ideologia jihadista", apurou o New York Times, "é a motivação da maioria dos insurgentes sunitas." Por US$ 100, um desempregado planta uma bomba ou abriga um terrorista armado. "Noventa por cento dos perpetradores", diz um oficial americano, "são apenas pessoas que querem alimentar as suas famílias."

Não há luz no fim do túnel. A senadora e presidenciável democrata Hillary Clinton, que em 2002 votou por autorizar Bush a atacar o Iraque, diz agora que "não podemos vencer" a guerra civil no país, e promete, se eleita, iniciar a retirada em 60 dias. O seu rival Barack Obama fala em concluir o repatriamento em 16 meses. O republicano John McCain, defensor da invasão, retruca que isso dará a vitória à Al-Qaeda - fingindo ignorar, aliás, que a ocupação foi o que a levou ao Iraque. Ele declarou retoricamente que, se necessário, forças americanas deveriam ficar ali "talvez 100 anos". O grande problema é precisamente este: a violência no país tende a se prolongar até onde o olhar alcança. Analistas militares acham que os Estados Unidos mal chegaram à metade do caminho. E um general da ativa, depondo no Capitólio, informou que os militares iraquianos não assumirão a responsabilidade pela segurança interna antes de 2012 e não serão capazes de defender as fronteiras nacionais antes de 2018.

Em novembro, o eleitorado americano dirá se isso é problema dos iraquianos ou se obriga os Estados Unidos a permanecerem no Iraque sabe-se lá por quanto tempo, ao custo sabe-se lá de quantas vidas.

(de http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20080319/not_imp142615,0.php)

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